juntando minhas lágrimas pelos que morrem todos os dias na Amazônia,
pelos desmandos dos "senhores feudais ", donos do Brasil,
que insistem em plantar em terras a margem dos rios ,
poluindo-os, enquanto pequenos agricultores,
pescadores , índios, ribeirinhos,
morrem de fome e bebem restos das águas contaminadas.
Quem somos nós, Humanidade?
Que fizemos de nós?
Construimos a cada dia mais torres de Babel ao nosso entorno?

Sufoco meu canto triste,
procuro alento na voz do poeta,
numa narrativa lírica do curso da História.
Quedo-me perante o saber do escritor e poeta Jorge Luis Borges:
"As Causas"
"Todas as gerações e os poentes.
Os dias e nenhum foi o primeiro.
A frescura da água na garganta
De Adão. O ordenado Paraíso.
O olho decifrando a maior treva.
O amor dos lobos ao raiar da alba.
A palavra. O hexâmetro. Os espelhos.
A Torre de Babel e a soberba.
A lua que os Caldeus observaram.
A areias inúmeras do Ganges.
Chuang Tzu e a borboleta que o sonhou.
As maçãs de ouro que há nas ilhas.
Os passos do errante labirinto.
O infinito linho de Penélope.
O tempo circular, o dos estóicos.
A moeda na boca de quem morre.
O peso de uma espada na balança.
Cada vã gota de água na clepsidra.
As águias e os fastos, as legiões.
Na manhã de Farsália Júlio César.
A penumbra das cruzes sobre a terra.
O xadrez e a álgebra dos Persas.
Os vestígios das longas migrações.
A conquista de reinos pela espada.
A bússula incessante. O mar aberto.
O eco do relógio na memória.
O rei que pelo gume é justiçado.
O incalculável pó que foi exércitos.
A voz do rouxinol da Dinamarca.
A escrupulosa linha do calígrafo.
O rosto do suicida visto ao espelho.
O ás do batoteiro. O ávido ouro.
As formas de uma nuvem no deserto.
Cada arabesco do caleidoscópio.
Cada remorso e também cada lágrima.
Foram precisas todas essas coisas.
Para que um dia as nossas mãos se unissem." * ¹
Se os homens voltassem os olhos para o passado,
num raro e místico instante,
e permitido fosse, num retrospecto, enxergar
as conquistas e os desatinos,
os fatos e os feitos do homem,
na história da humanidade,
E num relance lúcido,
olhassem com amor o sagrado solo
em que pisam e guerream,
continuariam a maculá-lo?
Grandes ou pequenos atos insanos.
Pensamentos infelizes
daqueles que têm o poder de mudar,
daqueles que podem lutar
pelo poder da palavra justa
mas que se omitem
concordam em ser cegos,
não de nascença,
mas por ser contagiosa a imoral cegueira.
Ou daqueles que só pensam em si
mesmo cônscios que nosso mundo
não mais aguenta
que falta-nos ar puro para respirar.
Que se não temos mais água pura,
se o ar é tóxico,
morremos todos, ricos e pobres.
A Natureza é generosa mãe,sim,
mas como alimentar seus filhos
se não tem mais frutos,
se as mentes corromperam os ares?
O que resta à Mãe Gentil,
senão morrer com suas crias?
Refletiriam genuflexos, humildes?
Se permitiriam ser menos destrutivos,
menos beligerantes?
Dariam a si próprios
o consolo da excelsa paz do espírito?
Tornar-se-iam
todos os seres,
mais humanos,
mais irmãos em humanidade?
Ah... homem,
olha para trás,
pára o erro louco desvario,
mas continua,
segue em frente,
aproveitando tudo
de mais puro e belo
que de melhor puderes buscar
na Memória da Terra,
na Memória do Tempo,
na tua própria memória.
Ouça a história dos grandes ou pequenos homens
que traçaram os rumos da nossa humanidade.
Ouça não a mim.
Ouça os apelos sofridos dos outros homens!
Ouça, aprende com o poeta!
*¹ Poesia de Jorge Luis Borges, in "Histórias da Noite"