E se...
E se a mulher, naquele dia,
ouvisse a voz da razão
seguisse o caminho mais lógico
aquele que se desviava de seus desejos
e que a fazia apenas cumprir suas obrigações?
Quanto de tristeza,
tanto de decepção
pelo peso mais forte
do que o corpo frágil
por assumir as responsabilidades
daqueles que lhes eram a vida,
que achava a mulher
que dela lhe dependiam.
E se o tanto e o quanto
nem foi percebido pelos que a cercavam?
E se não bastasse assim esse tanto.
Se passado o tempo
não reconhecessem o valor investido
na perda do sucesso e da glória sonhada?
Quantas vezes a mulher olhou à sua volta
E no meio dos seus era ela um vazio?
Quantas vezes parou
olhou para o lado
e se viu sozinha.
Não sem companhia, isso havia.
Era uma gente que realmente não acreditava nela.
E se havia a desconfiança de que nada ela valia,
valia o peso do tanto que ela lhes deu nesses todos dias?
E se o amor recebido não valesse a troca
da razão pelo desejo do coração da invisível mulher?
E se dela zombassem às suas costas?
Era a mulher tão sem sucesso e glória.
Como ela sobrevivia assim, penalizavam-se.
Era ela como aqueles
que se julgam alados
mas que do chão
nunca saltaram
nem um simples pulo
na direção daquilo
que sonharam um dia.
E se, ao final, a mulher percebe
não havia ninguém
que lhe valesse o sacrifício
de toda uma vida.
E se, ela fosse apenas uma ponte tosca
em que pisavam se apoiando
para darem seus saltos para o futuro?
E que, nesse futuro, ela, a ponte se via desnecessária...
A ponte...
era essa, mulher, a sua missão?
Ser a ponte de entrada
De passagem para os sonhos de outros sonhos?
E foi assim se observando na sua estrutura.
Olhando-se, notando-se
na perfeição dos mínimos detalhes
Feita de elos entrelaçados, fortes, vigorosos
Extremamente belos numa arquitetura de tramas milenares.
Era a mulher a ponte de nobre liga
cuja missão era dar passagem
desses mortais aqui para a vida.
Parece que guardam na memória
apenas que havia apoio
nos seus pés.
mas seus corações
suas mentes
seus sonhos...
Estão lá na frente
distantes na dimensão do salto!
E quem tem culpa?
Há culpados?
A ponte?
Os pés que nela pisaram?
A mulher?
Não sei...
Conta-se que ficou na férrea vontade de ser a base dos caminhos.
E que disso encheu-se das glórias e vitórias.
Há que se ter mulheres pontes?
Há que se ter pés distraídos?
Disso não sei nem tenho as certezas.
Vi-a uma vez, ali ainda fixada,
abaixo dela corre um riacho de águas claras.
E ela não era solitária
Pareceu-me fria
Fria de tão serena.
Não sonha,
só espera.
Espera voltar,
revirando-se sobre si mesma,
contorcendo-se nas suas tramas,
voltando ao não sei onde
do ponto do universo do qual veio.
Já não é mulher, assumiu sua forma de alma ponte.
Voltará ao início dos seu destino.
Férrea.
Forte.
Firme.
Feliz?
Impregnada da invencibilidade
e da imortalidade
da eterna vida.
Que sempre serve para algo,
mesmo que não se saiba
exatamente o quê,
nem os porquês.
Serve sempre.
A cada um fica o destino
que lhes pareceu mais certo.
Ou o destino a que submeteu
por engano, amor ou sorte!
Cada um sabe o que faz da sua vida.
Sinceramente...
essa história é meio triste.
Não gosto dela.
Eu não sou ponte!
Conheci uma.
Linda.
Mulher.
Simples.
Alegre.
Solitária.
Solidária.
Morreu.
Houve o benefício das lágrimas.
Vi pés chorando por alguns instantes.
Logo foi esquecida.
Não era necessária.
Ninguém se lembra dela.
Eu não sou mesmo ponte!
Nunca.
Uma vez, duas ou três, talvez.
Quem sabe?
- Maria Izabel Viégas -